quarta-feira, novembro 10, 2004

A Rosa

A moça acordou sem vontade de levantar. Já há algum tempo não via motivos para isso. A neve impiedosa daquela noite distante de inverno havia roubado toda a beleza do jardim, onde ela depositava todas as manhãs o que restava de seu amor, para ver florescer em cores diversas, aquilo que julgava não ser mais capaz de mover a vida.
Entretanto, naquela manhã a esperava no território da desesperança, uma surpresa.
Assim que abriu sua janela, um sorriso tímido brotou em seu rosto. Seus olhos transbordaram das lágrimas mais sinceras que aquelas terras já puderam sentir o peso da queda.
A última rosa havia brotado. Um pequeno botão ousava desafiar os ventos saindo corajosamente em direção aos céus. O caule espinhoso não era muito forte, mas ainda assim guardava com bravura toda a beleza que estava confinada naquele precioso botão.
E foi por essa beleza, que a moça resolveu cuidar da rosa.
Mandou que fizessem uma redoma do cristal mais límpido que houvesse. Encomendou também um vaso, lindo, com detalhes em ouro e prata com motivos florais, trabalhados pelas mãos mais competentes. Não mediu esforços naquele altar que construía para si mesma.
E foi com suas mãos carinhosas que ela mexeu a terra com cuidado para trazer bastante ar. Preparou uma pequena cova e então replantou a rosa como alguém que coloca um recém-nascido no berço. Colocou a redoma sobre o vaso, e levou tudo cuidadosamente à cabeceira de sua cama.
E assim, todos os dias a moça abria os olhos para a maravilha daquela rosa que desabrochada era a coisa mais bela que já havia visto. A textura das pétalas, a tonalidade rosa-chá, o verde intenso dos espinhos em contraste com o caule e força da terra eram de uma estética inigualável.
Inaugurou-se então uma fase de imensa felicidade. As flores cresceram fortes e majestosas, no jardim, enquanto a rosa imperava soberana sobre o criado-mudo. Era tão perfumada, que o cheiro inundava o ambiente mesmo estando ali confinada pelo opressor cristal. A moça se fartava de sorrisos enquanto a vida parecia fazer perfeito sentido. Tinha a certeza de que era feliz, mas não sabia enxergar a dimensão de toda a felicidade.
Foi quando a primeira pétala deitou-se sobre a terra úmida.
Inconsolável, a moça não sabia o que fazer. Tomou então a própria vida, somente para se ver deitar eternamente sobre um lindo canteiro de rosas.

Para Luiza

Um comentário:

Anônimo disse...

De Maya, do Véu de Maya(http://www.mayaweb.blogger.com.br)

O pequeno que nos sustenta...