quinta-feira, dezembro 21, 2006

nada

escapa aos olhos a extensão
quase à lembrança
um esforço hercúleo
a manter a nau em prumo
contra obstinada bússola
eis que falhas vistas
logram toda lógica
deparo-me novamente
desta linha pertinaz
à frente um passo traz
ante ao ávido terror
de experimentado curso
um regresso repentino
de temida empreitada
resta-me então um ato

terça-feira, dezembro 05, 2006

V

jamais se curam
as profundas cicatrizes
inquieto e audaz se faz o sangue
presta as homenagens, o portador rendido
àqueles mais fortes, mais resistentes
a luta justa, luta franca
faltam-me a coragem e o tempo
um levaste o outro
qual, não me recordo
tomado pelos vícios rotineiros
pelas vias respiratórias
me falta, a morte

segunda-feira, outubro 30, 2006

apresenta-se um início
arrastado, sofrido e melancólico
germina nos cantos frios e úmidos do cérebro
replica-se e contamina, afetuosamente
cria então uma outra verdade na mente
fortalece-se encontrando o sangue
alimento total, carmim cabal
institui-se assim como síndrome
manifesta-se nas unhas, nos olhos
último estágio, o calendário
onde o risco marca
o fim

segunda-feira, outubro 23, 2006

.

Aqui está o contrário
no leito temporal divido-me
que aquilo que jurei incompreensível
desfia-se diante de mim na mais pura conformidade
acende-se em chamas turvas a dúvida divergente
gira sempre a fortuna, teu lugar é o meu
o teu, te ocupas em alcançar
órbitas celestiais, eternos desencontros
retornam eternamente
ponto

sexta-feira, setembro 15, 2006

os olhos seguem o espelho
aguardam o momento oportuno
passas pelo outro lado
e diz "oi" como quem brinca
desejo-lhe, boa noite
o tempo pontual atravessa-nos
sigam todos, sigam
me digam, o que há mais a ser dito
lamento então, novamente
gostaria de mais, demais
pois teu gosto indelével
perturba meu paladar

terça-feira, agosto 08, 2006

nada

O tempo do tempo é infindávelmente inatingível
em meio à multidão desconhecida passa, intangível
ponto significante no cerne caótico da rua
reconhecido e visto, perto o bastante para os olhos
intocável ao tato, tolhendo os dedos de seus desejos
à nos sobra apenas a vida, impensável vida
indizível e inegável
o que nos resta então?
dizer o que não devemos
beber o que não podemos
saber o que já sabemos
eis que a vida surge novamente
inscrita em prosa e verso naquilo que nos significa
a, b, c, e todo o resto
que não cabe no grafite e na linha reta
e no entanto é vida como todo o resto
na potência do segundo
esconde-se tudo
tudo

quinta-feira, junho 29, 2006

os pássaros

Eis que em meu peito se apresenta
dor familiar, velha conhecida dos dias frios de inverno
entra arrebatadora desviando as atenções
ocupando imenso espaço vazio
enquanto me encontro em infinita labuta
encerro a vida demasiado curta
em quatro paredes, sem cortinas
espero a banda passar, esperançoso
passará, passará

quinta-feira, maio 25, 2006

por aí

do outro lado da rua
avizinhava-me das ondas
e do barulho do mar
desfiando os minutos
tecendo a paciência
carinhosamente
a ansiedade
pelo teu semblante
passageiro

sexta-feira, maio 05, 2006

a água se espalha no pára-brisa lembrando a vida
milhões de gotículas que são uma só massa intangível
e mesmo assim, só prestamos atenção àquelas gotas maiores
que escorrem solitárias vidro abaixo
traçando um caminho tortuoso, empurradas pela gravidade
o fim entretanto, é desconhecido

sexta-feira, março 17, 2006

Em fim sós

Cruzei contigo numa dessas esquinas movimentadas. Delírio.
Por um brevíssimo instante fui marcado por seu vermelho intenso, o memso que deixaste ao sair. Desespero.
Atravessaste a rua como um acidente de trânsito. Comoção.
Seguiu subindo a avenida arrastando a multidão com teu perfume de sol. Medo.
Avisei a todos que seguissem seus caminhos, apelo em vão. Amor.

Pois diga me a verdade, por fim, a verdade. Que o olhar que atravessou a rua não me encontrou no mar de gente, e seguiu só. Solidão.